Vou passar a vida fugindo para o mundo no qual os homens tenham a ilusão de que são, para que o outro mundo me abrace mais forte, mais e mais. Os conflitos entre os dois mundos ou entre os inumeráveis que se interpõem têm um sabor celeste e o sentido trágico da terra. O sorriso dos anjos eclipsa o conhecimento; mas quantas vezes o conhecimento nos deixou sós no desconsolo, privados das brisas celestes… As colunas do mundo são desgostos que se tornaram maldições. É preciso que o mundo desmorone para que tenhamos consolo? Mas os anjos voarão em nossa ajuda.
Quem compreendeu que este mundo não supera as ilusões só tem dois caminhos: tornar-se religioso, salvando-se do mundo; ou salvá-lo, destruindo-se. A concessão que fazemos à terra é o sacrifício de nossa vida. E as ilusões têm o seu altar. As sombras se nutrem de nosso sangue e de nossa renúncia. Constituem as capitulações e covardias ante a eternidade o esqueleto do mundo ao qual nos entregamos ou estamos respondendo apenas a uma tentação? Me possuirão as ilusões por inteiro? Poderei colocar meu desconsolo a serviço exclusivo das aparências? Se me iludo, as terei salvado e só será uma ilusão entre ilusões.
Um pressentimento de êxtase equivale a uma vida. Sempre que os limites do coração ultrapassem os do mundo, entraremos na morte por excesso de vida. O conteúdo do coração no qual se extravia o universo. O coração aberto a tudo ou sobre as dilacerações do coração… E sobre o sangue do coração que só mancha o céu. Meu Deus, nossas dilacerações tingirão o céu de vermelho!
O coração terá me desligado da terra? Ele a engoliu? Em que canto a buscarei, em que profundezas me reencontrarei? Meu Deus, caí no meu próprio coração!