PARA QUEM A VIDA é a realidade suprema, sem ser uma evidência, não seria “se podemos ou não amar a vida” a pergunta que mais pode atormentá-lo? Perturbadora e deliciosa incerteza, mas que requer uma resposta. É fascinante e amargo ao mesmo tempo não saber se se ama ou não a vida. Preferiríamos não ter de dizer um sim ou um não, só para não dissipar uma inquietude prazerosa. Um sim significa a renúncia a conceber e sentir outra vida; um não implica medo do caráter ilusório de outros mundos. Nietzsche se enganou quando, absorvido na revelação da vida, descobriu que a vontade de potência era o problema central e a modalidade essencial do ser. O homem colocado diante da vida quer saber se pode conceder-lhe seu último assentimento. A vontade de potência não é o problema essencial do homem; este pode ser forte sem ter nada. A vontade de potência nasce muitíssimas vezes em homens que não amam a vida. Quem sabe se a vontade de potência não é uma necessidade de fachada para a vida! A primeira interrogação ante a vida coincide com um apelo à nossa sinceridade. Que mais tarde busquemos ou não a potência é insignificante. O mundo busca a potência para jogar a última carta da vida.
CIORAN, Emil, O livro das ilusões. Trad. de José Thomaz Brum. Rio de Janeiro: Rocco, 2014, p. 122.