Do inconveniente de ter pai ou mãe bolsominion | Portal E.M. Cioran News

Na noite de 9 de janeiro, a produtora cultural carioca Ingryd Calazans Affonso, 35, recebeu uma mensagem da mãe, a corretora de imóveis Ana* (nome fictício), 63. “Isso é Deus, pátria e família. Brasil, sempre lutarei”, dizia o texto. Bolsonarista de primeira hora, a idosa estava detida na sede da Polícia Federal, em Brasília, depois de participar dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro.

Até aí, nenhuma surpresa para a filha, pois Ana já havia radicalizado o discurso durante o desgoverno Bolsonaro. Após a posse de Lula em outubro de 2022, a mãe de Ingryd foi pedir “intervenção federal” em frente ao Comando Militar do Leste. Ela viajou 15 horas de carona do Rio de Janeiro a Brasília para participar dos atos golpistas. Durante o trajeto, mandava fotos à filha, fingindo que estava numa viagem de férias.

Na noite do dia 9 de janeiro (a segunda noite passada na sede da Polícia Federal), escreveu para a filha contando orgulhosamente que estava usando a mesma roupa há dias, sem tomar banho. Não se tratava de uma queixa, mas de uma declaração de patriotismo. “Eu só via orgulho. Orgulho por estar presa, por não estar dormindo direito, por estar com a mesma roupa, por estar ali supostamente defendendo o futuro dos filhos”, contou Ingryd.

Depois de três dias, sua mãe foi liberada. Mas a relação entre mãe e filha nunca mais foi a mesma. Segundo Ingryd, a mãe voltou pior do que antes de ser presa. “O discurso dela inflamou ainda mais. Ela tem ainda mais orgulho de ser patriota agora. Eu sabia que ela não voltaria arrependida.”

A filha conta que ficou preocupada, mas que decidiu “não mover uma palha para tirar ela de lá”. “Não ofereceria um centavo do meu bolso. Ela que viva com as escolhas dela”, diz.

Após a libertação, a golpista passou a compartilhar vídeos nas redes sociais de outros manifestantes (“presos políticos” segundo ela) sendo liberados da prisão, em clima de festa. Ao todo, 2.182 pessoas foram detidas e 294 permanecem presas; os que receberam liberdade provisória precisam usar tornozeleira eletrônica e seguir uma série de regras judiciais.

Ingryd bloqueou a mãe no celular e nas redes sociais. Recentemente, a senhora golpista e orgulhosa de sê-lo pediu à filha para passar o fim de semana com a neta, de 6 anos. Ingryd concordou, sensibilizada por causa da menina, que nada sabe sobre a detenção da avó, sendo muito pequena para entender de política, golpismo, chauvinismo, fanatismo, bolsonarismo, nazifascismo e outras abominações que fazem parte do mundo dos adultos. “Quero preservar minha filha por enquanto e não acho justo afastá-la da avó”, declarou Ingryd, com o coração dividido.

Leia mais na reportagem de Camille Lichotti – TAB/UOL, 17 de março de 2023


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